A Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem) e a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso) lançaram a campanha Obesidade: conhecimento, cuidado e respeito!, em alusão ao Dia Mundial da Obesidade de 2022, lembrado hoje (4). O objetivo é conscientizar a população e eliminar preconceitos sobre o tema.


Um levantamento sobre obesidade e gordofobia, feito pelas
entidades em fevereiro do ano passado, com 3.621 pessoas, revelou que
88% delas apresentavam excesso de peso, sendo 37% com obesidade grau 3.
A
pesquisa revelou que oito em cada dez pessoas com obesidade já sentiram
algum tipo de constrangimento devido ao excesso de peso. Mais da metade
delas afirmou ser vítima de discriminação pelo menos uma vez ao mês.
Revelaram ainda que é no ambiente familiar onde ocorrem mais episódios
de constrangimento por causa do peso (72%). Em segundo lugar, aparecem
as lojas e o comércio em geral (65,5%), seguidos por situações de
discriminação no médico (60,4%) e no trabalho (50,7%).
De acordo
com o Ministério da Saúde, o excesso de peso acomete mais de 60% da
população brasileira, sendo que cerca de 20% dos adultos já são obesos.
Na avaliação da presidente do Departamento de Obesidade da Sbem, a
endocrinologista Maria Edna de Melo, a única forma de conseguir
minimizar o impacto da doença na saúde da população é por meio da
ampliação do conhecimento sobre o tema e do oferecimento do cuidado
adequado.
Para o vice-presidente do Departamento de Obesidade da
SBEM, Márcio Mancini, antes de ir para a escola, a criança obesa já tem
uma certa estigmatização dentro da própria casa, “fruto de como as
pessoas com excesso de peso são tratadas de modo geral”. Ele afirmou que
"a piada sobre gordinho" é algo que a população ainda não considera
como politicamente incorreto, mas como uma escolha individual da pessoa.
A
discriminação em casa ocorre, principalmente, quando a família possui
um filho com excesso de peso e outro magrinho, que compartilham o mesmo
ambiente, a mesma alimentação muitas vezes, “mas a genética de um é
diferente do outro”, disse Mancini à Agência Brasil.
Ajuda
Maria
Edna indicou que o preconceito pode, inclusive, piorar a obesidade,
porque quase 30% das pessoas com sobrepeso importante acham que são
culpadas por aquela condição e não buscam ajuda profissional.
“Não
é uma questão de força de vontade”, afirmou a especialista. Ela
ressaltou que a obesidade é uma doença que sofre influência de diversos
fatores como a genética, o estilo de vida, o estresse, a existência de
outras doenças associadas, alguns tratamentos medicamentosos, além do
tipo de alimentação que aquela pessoa segue. “Não é uma escolha
individual, mas consequência de uma confluência de fatores.”
Márcio
Mancini reforçou que a discriminação e o estigma que cercam as pessoas
com excesso de peso acabam sendo levados para os consultórios médicos.
“Mulheres com obesidade fazem menos exames preventivos, como
Papanicolau, mamografia. São menos examinadas”.
O médico
ressaltou que falta uma discussão mais profunda sobre isso. Os médicos
tratam menos também da doença obesidade, concentrando-se no colesterol,
na glicose alterada, na pressão alta. “Mas não abordam o problema de uma
forma mais eficaz.”
A sondagem mostrou que 81% das pessoas com
obesidade já tentaram perder peso de alguma forma, sendo que 68%
recorreram à ajuda especializada, seja de médicos, nutricionista ou
demais especialistas da saúde, e 32% o fizeram por conta própria.
Desses, mais da metade (63%) investiram no combo dieta e atividade
física.
“A sugestão aparentemente inocente de coma menos,
exercite-se mais sugere, no entanto, que a perda de peso está
relacionada exclusivamente com dieta e exercício, ignorando a
complexidade da doença que, muitas vezes, requer intervenções que vão
além do estilo de vida, passando pelo acompanhamento especializado e uso
de medicamentos adequados”, disse a endocrinologista Maria Edna.
Do
total de pessoas que afirmaram ter tentado perder peso por conta
própria, 18% declararam que fizeram uso de medicamentos sem
acompanhamento médico e demais artifícios arriscados como substitutos de
refeição (shakes), produtos ou medicamentos vendidos na internet,
fitoterápicos e chás. Maria Edna afirmou que esses números refletem a
resistência que as pessoas ainda têm de buscar ajuda especializada.
Doença
A
médica afirmou que há a necessidade de esclarecer à população, em
primeiro lugar, que “estamos falando de uma doença que, como outra
qualquer, precisa de tratamento”. Ela ressaltou a importância de deixar
claro que mudança do estilo de vida significa entrar em um universo
cheio de desafios.
“O controle do nosso apetite ocorre nas áreas
mais primitivas do nosso sistema nervoso central. Quando estamos na
frente de um alimento, principalmente aqueles hiperpalatáveis,
industrializados, ricos em açúcar, com inúmeros atrativos, somos levados
a um ato quase automático pelo próprio corpo. A região cortical do
nosso cérebro, onde realizamos as ponderações, tem participação muito
pequena”, explicou a doutora.
A pesquisa revelou também que
somente 13% das pessoas procuraram ajuda para perder peso no Sistema
Único de Saúde (SUS), sendo que 62% desse contingente declararam que não
se sentiram confortáveis e acolhidos no atendimento. A sensação crescia
quanto maior era o grau de obesidade. Segundo Maria Edna, isso chama a
atenção para outro dado preocupante, que é o preconceito que a pessoa
com obesidade sente ao procurar ajuda médica. “Precisamos de
profissionais mais bem preparados e prontos para atender a essa
demanda”, manifestou a endocrinologista.
Márcio Mancini sublinhou
que a maior parte das escolas médicas do país dedica muito pouco dos
seis anos de ensino para falar sobre obesidade com os alunos. Revelou
ainda que uma grande parte das residências médicas de endocrinologia
ensina para os residentes doenças da tireoide, da hipófise, doenças do
crescimento e do desenvolvimento, mas algumas não têm sequer obesidade
como matéria considerada importante.
Diagnóstico
Uma
pessoa apresenta diagnóstico de obesidade quando seu Índice de Massa
Corporal (IMC) é maior ou igual a 30 kg/m2. A faixa normal varia entre
18,5 e 24,9 kg/m2. Segundo o Ministério da Saúde, a obesidade é um dos
principais fatores de risco para várias doenças não transmissíveis, como
diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, hipertensão, acidente
vascular cerebral e várias formas de câncer.
O Dia Mundial da
Obesidade foi criado pela Federação Mundial de Obesidade (WOF, do nome
em inglês) com o objetivo de aumentar a conscientização sobre a doença,
incentivar a mudança, melhorar as políticas de atendimento às pessoas
com obesidade e compartilhar experiências.
A data comemorativa
original era 11 de outubro mas, em 2020, ela foi mudada pela WOF para 4
de março. Segundo a WOF, 800 milhões de pessoas em todo o mundo vivem
com obesidade e as consequências médicas da doença custarão mais de US$ 1
trilhão aos países, até 2025.