
A prefeitura de Maceió tem sido duramente criticada por
ações agressivas e desumanas contra a população em situação de rua. O
episódio mais recente ocorrido na Praça Sinimbu, no Centro da capital,
exemplifica o que muitos têm chamado de uma política “higienista” que
visa “varrer para longe dos olhos do público” as pessoas que já
enfrentam extrema vulnerabilidade.
Na quarta-feira, 14 de agosto,
faltado menos de uma semana para o Dia Nacional de Luta da População em
Situação de Rua (19/08), a Guarda Municipal de Maceió realizou uma
operação que resultou na apreensão de pertences pessoais de moradores de
rua, incluindo documentos, roupas e até abrigos improvisados. Segundo
relatos de testemunhas, os itens foram tratados como lixo, jogados em
caçambas sem qualquer respeito pela dignidade daqueles que os possuíam.
Adelson
Santos, que vive nas ruas há dois anos, foi uma das vítimas dessa ação.
Ele expressou sua indignação ao ver seus poucos pertences levados e seu
abrigo destruído. “A gente foi roubado. Levaram minhas coisas. Consegui
recuperar meus documentos porque já estava em cima da caçamba”,
relatou. A frustração de Adelson é compartilhada por muitos outros que
perderam tudo o que tinham em questão de minutos.
Em resposta a
estas outras ações similares, a Defensoria Pública do Estado de Alagoas
(DPE-AL) moveu uma Ação Civil Pública contra o município, resultando em
uma decisão do juiz Léo Dennisson Bezerra que proíbe a remoção forçada e
a apreensão de bens de pessoas em situação de rua. A decisão também
determina a devolução dos itens confiscados no prazo de 10 dias. No
entanto, até o momento, os moradores não têm esperança de que essa
devolução ocorra de fato.
O defensor Público Isaac Vinícius Costa
Souto explica que a decisão saiu depois que foram registradas várias
ocorrências em descumprimento da ADPF 976: “infelizmente, essas ações
persistiram, sem que do outro lado o ministro cumpra com suas
obrigações, a exemplo do aluguel social ou da assistência a estas
pessoas. O correto seria acolher a população em situação de rua e não
destruir ou se apossar dos seus pertences, inclusive documentos”,
pondera.
Rafa Machado, representante nacional da população em
situação de rua em Alagoas, criticou a postura da prefeitura,
classificando-a como uma tentativa de “higienização social” em pleno
período eleitoral. Para ele, o que está em jogo não é apenas a remoção
física dessas pessoas dos espaços urbanos, mas uma clara tentativa de
invisibilizar e marginalizar ainda mais uma população já desprovida de
direitos básicos.
“A prefeitura promoveu essa higienização às
vésperas da semana nacional de luta. É uma falta de respeito muito
grande”, declarou. Ele também chamou a atenção para a ausência de
políticas públicas efetivas em Maceió que possam oferecer soluções reais
para essas pessoas. “Agora, a população de rua recolhendo suas coisas, e
eu pergunto aos órgãos de controle externo: quando vamos fazer valer a
ADPF 976?”, questionou.
O que é
A
Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 976,
mencionada por Rafa, foi proposta pelo ministro Alexandre de Moraes, do
Supremo Tribunal Federal (STF), e impõe a estados e municípios a
obrigação de proteger os bens e a segurança das pessoas em situação de
rua, proibindo ações como a remoção forçada e o uso de técnicas de
arquitetura hostil contra essa população.
As ações da prefeitura
de Maceió não só violam direitos fundamentais, como também contrariam
decisões judiciais e princípios básicos de dignidade humana. A gestão de
JHC, ao optar por uma abordagem repressiva e insensível, ignora
completamente as necessidades e os direitos das pessoas mais vulneráveis
da cidade.
Adelson Santos, assim como muitos outros, expressa um
desejo simples, mas poderoso: "Quem não quer sair dessa situação? Ter
seu cantinho, poder pagar um aluguel, trabalhar". Esse desejo, no
entanto, continua sendo um sonho distante enquanto políticas públicas
efetivas continuam a ser ignoradas em favor de medidas punitivas e
excludentes.
O que se espera da administração pública,
especialmente em tempos de crise social, é a promoção de soluções
humanas e justas que garantam a dignidade e o bem-estar de todos os
cidadãos, independentemente de sua condição. Infelizmente, o que se vê
em Maceió é uma gestão que prefere varrer o problema para debaixo do
tapete, ao invés de enfrentá-lo com a seriedade e a empatia que ele
exige.