
O Brasil pedirá explicações ao governo de Donald
Trump pelo que chamou de “desrespeito aos direitos fundamentais” de 88
migrantes irregulares brasileiros deportados dos Estados Unidos, que
foram algemados durante a viagem, informou o Ministério de Relações
Exteriores brasileiro.
Este é o primeiro episódio de tensão entre
os governos do novo presidente dos Estados Unidos e de Luiz Inácio Lula
da Silva, que manifestou seu desejo de preservar a “relação histórica”
entre Washington e Brasília no dia da posse de Trump, em 20 de janeiro.
Segundo
o Itamaraty, será apresentado um “pedido de explicações ao governo
norte-americano sobre o tratamento degradante dispensado aos passageiros
no voo” procedente dos Estados Unidos que aterrissou na noite de
sexta-feira em Manaus, afirmou a chancelaria brasileira em sua conta no
X.
Um nota oficial do governo no sábado confirmou um total de 88 brasileiros a bordo da aeronave.
“A
gente ia amarrado no pulso, na cintura e na perna, não tinha água, a
gente pedia para ir no banheiro e não deixavam”, declarou à AFP Edgar Da
Silva Moura, um técnico de informática de 31 anos que chegou deportado
no voo após sete meses de detido nos EUA.
“Estava muito quente, pessoas desmaiaram”, adicionou.
Luis
Antonio Rodrigues Santos, um trabalhador autônomo de 21 anos relatou o
“pesadelo” de pessoas com “problemas respiratórios” que passaram “quatro
horas sem ar condicionado” devido a problemas técnicos, que também
afetaram “uma turbina que não estaria funcionando”.
“Já mudou muita coisa [com Trump] (…), imigrantes tratados como criminosos”, afirmou.
A
ministra dos Direitos Humanos e Cidadania, Macaé Evaristo, disse à
imprensa que na aeronave também havia “crianças com autismo, com algum
tipo de deficiência, que passaram por situações muito graves”.
“Desrespeito aos direitos fundamentais”
O
Ministério da Justiça ordenou “a retirada imediata das algemas” quando o
avião chegou ao país, e repudiou o que chamou de “flagrante desrespeito
aos direitos fundamentais” dos seus cidadãos.
As autoridades
brasileiras enfatizaram que “a dignidade da pessoa humana” é “um dos
pilares do Estado Democrático de Direito” e configura “valores
inegociáveis”.
Uma fonte do governo brasileiro explicou na
sexta-feira à AFP que a deportação “não tem uma relação direta” com a
operação contra imigrantes irregulares iniciada nos Estados Unidos após a
posse de Trump.
“Este voo está inserido em outro contexto: um
acordo bilateral entre Brasil e Estados Unidos de 2017, que permanece em
vigor” e que já resultou em expulsões em anos anteriores, disse a
fonte.
A aeronave tinha como destino Belo Horizonte, mas devido a
um problema técnico teve que aterrissar em Manaus, cidade prevista
originalmente como escala.
“Os brasileiros que chegaram algemados
foram imediatamente liberados das algemas”, informou a PF, “em garantia
da soberania brasileira em território nacional”.
As autoridades
forneceram colchões, atendimento médico e água para os passageiros, que
precisaram permanecer a noite toda em uma sala do aeroporto.
O
presidente Lula ordenou no sábado que um avião da Força Aérea fizesse o
transporte dos deportados para o seu destino final. O voo chegou às
21h10 a Belo Horizonte segundo a Força Aérea.
Migração irregular na mira
Nos
primeiros dias de seu mandato, Trump ordenou várias medidas contra a
migração irregular, incluindo deportações, o envio de tropas à fronteira
com o México e a prisão de 538 pessoas em situação irregular, conforme
relatado pela Casa Branca.
Na sexta-feira, 265 pessoas foram deportadas dos Estados Unidos para a Guatemala.
Trump
atacou durante sua campanha os imigrantes ilegais, descrevendo-os como
“selvagens”, “animais” e “criminosos”. O republicano prometeu a maior
campanha de deportações da história dos Estados Unidos, onde vivem cerca
de 11 milhões de pessoas em situação irregular.
Uma fonte do
governo brasileiro disse que os deportados que chegaram a Manaus
viajaram “com seus documentos pessoais”, o que mostra que estavam “de
acordo” com o retorno ao país. Eles poderão “permanecer em liberdade” no
Brasil, após terem sido detidos nos Estados Unidos com “decisão final
de deportação sem possibilidade de recurso”, detalhou a fonte.