A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal) tem
sido protagonista na transformação da ciência local por meio de
programas que conectam conhecimento, inovação e saúde pública. Um
exemplo dessa atuação estratégica é o projeto intitulado “Epidemiologia
molecular do vírus chikungunya em regiões endêmicas do estado de
Alagoas”, finalizado em fevereiro de 2025.
Desenvolvido no
Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal (PPGCA) da Universidade
Federal de Alagoas (Ufal), o estudo foi coordenado pelo professor
Abelardo Silva e contou com o trabalho de duas bolsistas: Thais Fraga e
Mykaella Araújo.
Financiado por meio do Programa de Apoio à Fixação
de Jovens Doutores no Brasil — uma iniciativa do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), na qual a Fapeal é
parceira — o projeto analisou a estrutura genética de amostras do vírus
chikungunya circulantes em Alagoas, colhidas entre os anos de 2016 a
2024.
A investigação envolveu o sequenciamento de 60 genomas
completos do vírus, a partir de amostras humanas e de vetores
(mosquitos), o que permitiu identificar mutações que indicam maior
capacidade de transmissão e severidade da infecção nos últimos surtos
registrados no estado.
“A genômica permite, hoje, rastrear a história
evolutiva do vírus. Assim como na medicina de precisão, conseguimos
correlacionar mutações genéticas com características mais agressivas do
patógeno. Isso pode subsidiar políticas públicas e, principalmente, a
eficácia de vacinas e tratamentos”, explicou o professor Abelardo Silva.
Contribuição para a saúde pública
O
estudo revelou alterações genéticas importantes nas linhagens do vírus
chikungunya identificadas em diferentes ondas epidêmicas no estado.
Essas mutações ajudam a explicar relatos recorrentes de pacientes
alagoanos sobre sintomas persistentes, sugerindo que a doença tem se
manifestado de forma mais crônica na região.
“Um dos
desdobramentos do nosso trabalho, a dissertação de Leonardo Lima, também
identificou mosquitos infectados em regiões turísticas de Maceió, como
Ponta Verde e Jatiúca. Esse dado é fundamental para orientar o controle
vetorial pelas autoridades municipais”, relatou Thais Fraga.
A descoberta mostra que construções ativas também
podem abrigar focos do vetor, contribuindo para a proliferação da
doença, um dado que pode orientar diretamente políticas de vigilância
sanitária.
Além disso, o estudo impulsionou a criação de novas
metodologias para identificação de linhagens virais sem a necessidade do
sequenciamento genômico completo. Desenvolvidas por estudantes de
iniciação científica e pós-graduação, essas ferramentas visam
diagnósticos mais rápidos e acessíveis, fundamentais para a realidade de
muitos laboratórios no estado.
Foi neste âmbito inclusive que,
parcerias puderam ser estabelecidas ao longo da pesquisa. O grupo
colaborou com o Instituto Aggeu Malhães (IAM), vinculado à Fundação
Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Laboratório Central de Saúde Pública de
Alagoas (LACEN/AL), o que viabilizou o uso das amostras sequenciadas
para o desenvolvimento de testes diagnósticos mais modernos, como o
método LAMP, atualmente em padronização nacional.
Jovens doutoras e os impactos gerados
Aprofundando-se
neste cenário, a trajetória das jovens doutoras também se mostrou
fundamental para os resultados obtidos. Thais Fraga, que adquiriu o
título na Universidade Estadual Paulista (Unesp), atuou como bolsista da
Fapeal entre janeiro e setembro de 2023. Após ser aprovada em concursos
públicos, ela cedeu a bolsa, mas permaneceu contribuindo ativamente com
o projeto. Sua participação garantiu igualmente a orientação de novos
estudantes e a continuidade das ações planejadas.
A partir de
outubro de 2023, Mykaella Araújo assumiu a bolsa e conduziu os trabalhos
até outubro de 2024. Sua atuação foi marcada pela introdução de
metodologias inovadoras de sequenciamento e pela ampliação de parcerias
institucionais. “O apoio da Fapeal viabilizou uma infraestrutura inédita
para o nosso grupo de pesquisa. Adquirimos tecnologia de alta
performance e consolidamos parcerias institucionais estratégicas. Mais
do que impulsionar minha carreira, essa bolsa impactou positivamente a
vigilância em saúde pública em Alagoas”, afirmou a pesquisadora.
O
projeto também resultou na formação de novos talentos. O mestrando
Leonardo Lima, orientado por Thais Fraga e coorientado por Abelardo
Silva, foi premiado como autor do melhor trabalho na área de Virologia
de Invertebrados durante o 35º Congresso Brasileiro de Virologia,
realizado em Foz do Iguaçu, em outubro de 2024.
Perspectivas futuras
Atualmente,
os impactos do projeto vão muito além dos resultados científicos. O
fortalecimento da infraestrutura laboratorial, a formação de novos
talentos e a conexão direta com as demandas do LACEN/AL consolidaram um
modelo de pesquisa aplicada com retorno concreto para a sociedade.
“A
partir dos editais da Fapeal, conseguimos estruturar um laboratório
mais robusto, com equipamentos como o ultrafreezer, por exemplo, que tem
sido essencial para armazenar amostras com segurança. Isso impacta toda
a rede de pesquisas da Ufal e permite novos projetos”, explicou o
coordenador do trabalho.
Abelardo Silva também adiantou que o grupo está
desenvolvendo novas propostas para dar continuidade às investigações
sobre arboviroses em circulação no estado. “A ideia é atender
diretamente às demandas do sistema de saúde. A parceria com o LACEN/AL
foi fortalecida por esse projeto, e isso nos permite responder de forma
rápida a novos surtos virais”, afirmou ele.
Thais Fraga e
Mykaella Araújo continuam atuando na docência e na pesquisa em
instituições públicas, contribuindo para a formação de novos cientistas e
ampliando a presença feminina na ciência alagoana.
E o projeto,
que teve início com o sequenciamento de genomas, hoje reverbera em
salas de aula, laboratórios equipados, colaborações consolidadas e
avanços na saúde pública do estado.