O temor de novos ataques golpistas levou o interventor da segurança do Distrito Federal a fechar a Esplanada. Alexandre de Moraes, do STF, proibiu bloqueio de vias por bolsonaristas, sob pena de multa e prisão. Ontem, o Supremo formou maioria para manter afastado o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB).
BRASÍLIA E SÃO PAULO O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), tomaram na quarta-feira (11) novas medidas contra possíveis manifestações golpistas de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
As ações ocorreram três dias depois da jornada de vandalismo e depredação contra os edifícios sede dos Três Poderes em Brasília.
O interventor na segurança do Distrito Federal, Ricardo Cappelli, ordenou o reforço da segurança e decidiu fechar a parte principal da Esplanada dos Ministérios. A decisão ocorreu devido à ameaça de novas manifestações bolsonaristas, que ao menos na quarta não se concretizaram.
Moraes, por sua vez, determinou que as autoridades públicas do país impeçam quaisquer tentativas de ocupação ou bloqueio de vias públicas, rodovias, espaços e prédios públicos por militantes do ex-presidente.
A ordem, que prevê prisão e multa, foi dada em resposta a um pedido da AGU (Advocacia-Geral da União), que alertou o ministro a respeito da chamada “Mega manifestação nacional —pela retomada do poder”, convocada por bolsonaristas nas redes sociais para as 18h.
O ministro impôs a “aplicação imediata pelas autoridades locais” de multa de R$ 10 mil para pessoas físicas e R$ 100 mil para pessoas jurídicas, por hora, que descumprirem essa proibição “por meio da participação direta nos atos antidemocráticos, pela incitação (inclusive em meios eletrônicos) ou pela prestação de apoio material (logístico e financeiro) à prática desses atos”.
Em caso de desobediência ou obstrução de vias e invasão de prédios públicos, as autoridades deverão executar prisão em flagrante, segundo Moraes, sob pena de responsabilização pessoal.
O ministro afirmou que o atual cenário de escalada de violência e de desacato à Constituição exige reação proporcional do Estado, de modo “a inibir o exercício abusivo dos direito de reunião e livre manifestação”.
Moraes tem concentrado as decisões mais enérgicas contra os ataques golpistas. Poucas horas depois dos atos de vandalismo, ele ordenou o afastamento do cargo do governador Ibaneis Rocha (MDB) e o desmantelamento dos acampamentos bolsonaristas em frente a quartéis pelo país.
Na terça (10), ele decidiu ainda pela prisão do ex-secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres —que também é ex-ministro de Bolsonaro— e do ex-comandante da PM local, Fabio Augusto Vieira. Para o magistrado, ficou “amplamente comprovada” a “omissão” de Torres e Vieira diante da “previsibilidade da conduta dos grupos criminosos e pela falta de segurança que possibilitou a invasão dos prédios públicos”.
Em Brasília, a convocatória bolsonarista não teve adesão na quarta. No horário marcado, praticamente não havia manifestantes na Esplanada dos Ministérios.
A Esplanada foi protegida por um forte aparato policial, com diversos pontos de bloqueios, cavalaria a postos, helicópteros sobrevoando a área e dezenas de integrantes do corpo de bombeiros.
A cena de quarta contrastou com o visto no domingo, quando milhares de bolsonaristas desceram a Esplanada dos Ministérios praticamente sem objeção das forças policiais do DF. Eles entraram e depredaram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o STF.
Cappelli, que é secretário-executivo do Ministério da Justiça, inspecionou a segurança na Esplanada e ouviu informe de agentes da PM sobre o reforço no local.
Ele foi perguntado sobre quem teria a culpa principal pelos atos de 8 de janeiro. Em resposta, disse que “não foi à toa” que Moraes decretou a prisão de Anderson Torres. O ex-ministro de Bolsonaro está nos Estados Unidos e promete voltar ao Brasil para se entregar à Justiça.
Mais cedo na quarta, Cappelli descartou a necessidade de prisão na manifestação de quarta se tudo ocorresse pacificamente. “Depende do comportamento, se a manifestação for pacífica não há necessidade nenhuma em falar de prisões”, disse.
Em entrevista à Folha na terça o interventor na segurança do Distrito Federal isentou o governo Lula de qualquer responsabilidade sobre as falhas de segurança registradas no dia da invasão do Congresso, do Palácio do Planalto e do STF.
Ele também apontou sabotagem de Torres. “Claro que houve uma quebra de confiança. A maior prova de que houve uma quebra de confiança é o fato de eu estar sentado aqui [como interventor]”, afirmou.
Ele também disse que era “inimaginável” que “grupos de extrema direita seriam capazes de invadir o Supremo Tribunal Federal para arrancar portas de gabinete de ministro.”
Também nesta quarta, diante da convocação de protestos em redes sociais, houve reforço de policiamento em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Belo Horizonte, Porto Alegre e Salvador. Mas praticamente não houve adesão também nessas cidades.
Ainda na quarta, a Polícia Federal encerrou a tomada de depoimento dos bolsonaristas envolvidos nos ataques golpistas.
Das 1.843 pessoas detidas no acampamento no Quartel-General do Exército na segunda (9), 1.159 foram presas e encaminhadas para a prisão e outras 684, a maioria mulheres, crianças e idosos, acabaram liberadas por ordem do ministro Alexandre de Moraes.
Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal, os homens estão sendo conduzidos para o Centro de Detenção Provisória 2, no complexo penitenciário da Papuda, e as mulheres, para a Penitenciária Feminina do DF.
A partir de agora, a investigação prossegue. De um lado, esses bolsonaristas presos e outros envolvidos nos atos golpistas serão investigados pela PF, que fará uma individualização da conduta de cada um.
O objetivo da apuração é saber se houve uma organização anterior e quem foram os possíveis financiadores dos atos golpistas.
Por outro lado, também por ordem de Alexandre de Moraes, está sendo apurada a participação ou omissão de agentes públicos.
O acampamento bolsonarista no Quartel-General do Exército foi desmobilizado na manhã de segunda. A ação só foi possível após tensas negociações ainda na noite de domingo que envolveram o interventor Cappelli, oficiais do Exército e os ministros Flávio Dino (Justiça), Rui Costa (Casa Civil) e José Múcio Monteiro (Defesa).
Cappelli e Dino eram partidários que a polícia realizasse as prisões de suspeitos de participação nos atos de vandalismo ainda na madrugada. Já no comando da Segurança Pública do DF, ele chegou a enviar efetivo para o SMU (Setor Militar Urbano).
Os agentes policiais foram impedidos de se aproximar pelo Exército, que montou um cordão de bloqueio de soldados e três blindados. O argumento dos militares era que, por se tratar de área militar, qualquer operação precisaria antes passar por uma negociação com a força.
“Os direitos de reunião e livre manifestação são relativos e não podem ser exercidos, em uma sociedade democrática, de maneira abusiva e atentatória à proteção dos direitos e liberdades dos demais, às exigências da saúde ou moralidade Alexandre de Moraes ministro do STF, em decisão expedida nesta quarta-feira (11).
Autor: Raquel Lopes, Ranier Bragon, Danielle Brant, Fábio Pescarini, Fabio Serapião, Cézar Feitoza, José Marques e Constança Rezende
Fonte: pressreader.com/Folha de S.Paulo