A manhã desta quarta-feira (6) foi marcada pelos
protestos das vítimas da mineração criminosa da Braskem, em Maceió.
Representações das frentes políticas e populares envolvidas no processo
contra a mineradora estiveram presentes no ato que seguiu entre os
bairros do Farol e Centro.
De acordo com informações do
Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), outro protesto está
sendo organizado, desta vez na parte baixa da cidade. A manifestação
será realizada no dia 13 de dezembro, próxima quarta-feira, e o grupo se
concentrará no Marco dos Corais, no bairro da Ponta Verde.
Dilson
Ferreira, professor de arquitetura e urbanismo, da Universidade Federal
de Alagoas (Ufal), e uma das principais vozes sobre a recente questão
urbana de Maceió estava presente no ato e conversou com o Jornal de Alagoas sobre o próximo ato das vítimas da Braskem.
Segundo
o docente, a motivação do movimento desta manhã foi a urgência em
retirar as famílias ilhadas, que ainda permanecem nas regiões mais
afetadas, como os Flexais, Mutange e Bom-Parto. Para o professor, a
Defesa Civil de Maceió omite informações que poderiam ser conclusivas
sobre o caso.
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“A
gente está aqui protestando pelas vítimas, pode ser que eles voltem,
pode ser que esse protesto seja contínuo, outros protestam e outros não
sabem o que pode vir a acontecer. Defesa civil não fala a verdade, o que
serve oculta informações, então assim, essa é a nossa região e a gente
vai lutar até o fim, junto com todo mundo".
Ele continuou e fez
elogios ao movimento coletivo, que segundo o próprio, visa à resolução
de graves sequelas causadas pela Braskem. Dilson destacou o caráter
apartidário da manifestação.
“O legal desse ato hoje é que o ato
todo é apartidário, todas as pessoas vieram, e é um ato que está
crescendo cada dia a mais, e convoco a todos no dia 13, lá no Marco dos
Corais, vamos ampliar esse ato e vamos lutar pelos direitos de todos.”
O protesto
O
professor ressalta que a luta do movimento é por toda a sociedade, e
não só por uma porção da cidade que foi destruída pela Braskem.
“Então é assim, a luta é por todos, a luta não é só por essa porção da cidade que foi destruída, mas pela cidade. Tem o impacto da destruição e colapso de 35 minas, se isso acontecer, não vai ser [um problema] só para essa população, vai ser para a cidade inteira”. Ele explica que questões econômicas, sociais e de mobilidade podem se agravar caso o cenário se agrave.
“Vai afetar tudo ao redor na mobilidade, no
preço do imóvel, no preço da habitação, na exclusão dessas pessoas para
fora do município, porque muita gente foi para o Pilar, para Rio Largo.
Então assim, é um problema ambiental, social e econômico, não é só o
problema das vítimas, é o problema da cidade inteira”.
Dilson
preocupa-se com o tamanho da questão de Maceió e afirma que este é um
problema nacional, relembrando os problemas envolvendo a Vale,
mineradora responsável pelas tragédias de Mariana e Brumadinho, em Minas
Gerais. “A gente sabe que isso vai acontecer de novo, a gente precisa
alertar a todos para que isso não se repita”
Universidade Federal x Braskem
A
Universidade Federal do Estado, cerca de 50 anos atrás, comentou que a
exploração de sal-gema em áreas urbanas poderia desencadear em problemas
como o que vivemos atualmente.
“A gente [corpo docente da UFAL]
é contrário, desde o início. Até porque a própria instalação da Braskem
foi um ato autoritário, na época da ditadura, onde o governo e o
Ministério Público foram autoritários. O governador deu um ato de
criação da Salgema [antigo nome da mineradora Braskem], destruindo uma
restinga no Pontal da Barra. Então o próprio ato de criação da empresa é
um crime. O segundo crime é você minerar numa área urbana".
O
alerta da Ufal foi relembrado por Dilson, ao citar o caso do
esvaziamento do bairro Bebedouro, que é um bairro histórico para Maceió.
A região abriga as primeiras construções de Maceió. A mineração,
segundo ele, acabou com memórias da capital alagoana e mudou o
pensamento coletivo maceioense sobre a própria história- uma mancha no
imaginário coletivo.
“Lembre-se que, no Bebedouro já existiam
pessoas lá desde 1820. Então é o núcleo original da cidade. Está
destruindo uma história da cidade. Então assim, a gente que é do
movimento vê da seguinte forma 'é uma indignação justa'”.
Indenização para vítimas | reparação histórico- ambiental
Na
entrevista, o professor citou um ponto de vista importante. A cidade de
Maceió não desenvolveu um problema crônico sozinha, existe culpa de
alguém e a responsabilidade deve ser cumprida. “Tem que se reverter
todos os recursos que foram orientados desse acordo para as vítimas e
para a cidade.”
O desgaste ambiental, com a exploração das minas,
é imenso. O urbanista chegou a informar uma demora de cerca de 30 a 40
anos para que a região seja reabilitada.
“É um crime que, mesmo
que hoje fosse ressarcido todo mundo, ficaremos com esse passivo
ambiental durante décadas e vai ter que ser reinvestido muito. Não é a
gestão de JHC e nem a próxima, nem a próxima. São várias gestões. Está
no mínimo aí uns 30, 40 anos para que essa área seja reabilitada”.
