O ataque de Israel ao Irã causou forte repercussão nos mercados
internacionais, deixando o agronegócio brasileiro em alerta. Como reação
imediata ao bombardeio de alvos iranianos – incluindo a usina nuclear
de Natanz, a maior do Irã, e bases aéreas – o preço do petróleo
disparou, registrando alta superior a 7% logo no início do dia.
Esse
movimento de valorização se refletiu também nas cotações de commodities
agrícolas. Na manhã desta sexta-feira, 13, óleo de soja, trigo e óleo
de palma subiram mais de 2% nas bolsas internacionais. Produtos como
suco de laranja, aveia, borracha e óleo de canola também apresentaram
ganhos superiores a 1%.
Em entrevista ao Agro Estadão, o
professor João Alfredo Nyegray, especialista em negócios internacionais e
geopolítica da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR),
explicou que o conflito entre Israel e Irã representa um risco real para
as cadeias globais de suprimentos, especialmente no que diz respeito à
segurança alimentar e à logística internacional.
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Contudo,
há um impacto direto sobre o agronegócio brasileiro. “O agro é um dos
motores da economia nacional e, justamente por isso, está muito exposto a
choques como esse. O alerta principal é duplo: risco para o
fornecimento de insumos e dificuldade de entrega de produtos, como milho
e carnes halal, a mercados estratégicos como o Oriente Médio”, sinaliza
Nyegray.
No aspecto de importação, o alerta está na compra de
insumos. Isso ocorre porque o Brasil importa cerca de 80% dos
fertilizantes utilizados nas produções agropecuárias e boa parte desse
volume vem de países direta ou indiretamente afetados pela tensão no
Golfo Pérsico. Além disso, o Irã desponta como um importante fornecedor
de ureia e de derivados petroquímicos fundamentais para a indústria de
fertilizantes.
Segundo Nyegray, se houver uma retaliação iraniana
– como o bloqueio do Estreito de Ormuz, que conecta o Golfo Pérsico com
o Golfo de Omã e por onde passa cerca de 20% do comércio global de
petróleo – ou sanções internacionais contra Teerã, o fornecimento desses
insumos pode ser comprometido. “Com a redução da oferta e o
encarecimento do frete, o preço do fertilizante pode subir rapidamente. E
isso pressiona os custos de produção no Brasil”, alerta o professor.
Esse
risco se soma a um cenário já sensível para os produtores brasileiros
que ainda não fecharam a compra de seu pacote de insumos para a safra
2025/26. Conforme noticiado pelo Agro Estadão, o ritmo de vendas este
ano está lento, assim como no ano passado.
Exportações ameaçadas
No
outro extremo da cadeia, o escoamento de produtos brasileiros para
países islâmicos também está em xeque. O Oriente Médio e o Norte da
África são mercados estratégicos para as proteínas animais do Brasil.
Segundo
dados da Associação Brasileira de Proteína Animal, no ano passado,
30,59% da carne de frango exportada pelo Brasil teve como destino países
do Oriente Médio, enquanto a África representou 18,70% do mercado. Além
disso, o Irã figura entre os 20 principais compradores de milho
brasileiro.
Assim, uma escalada do conflito ou ações grupo
extremistas aliadas ao regime iraniano – como Hezbollah (Líbano), Hamas
(Palestina) ou forças no Iraque e Iêmen – podem desestabilizar
politicamente a região. Isso desencadearia um retrocesso da demanda,
dificuldades logísticas e até boicotes por motivos religiosos ou
geopolíticos.
“É um xadrez complexo. Se o Irã ou seus aliados
dificultarem o tráfego marítimo ou atacarem navios mercantes, haverá
restrições logísticas severas. Por isso, o frete marítimo já está
subindo rapidamente hoje”, salienta Nyegray.
Pressão inflacionária
O
aumento do preço do petróleo afeta diretamente o custo do diesel no
Brasil, encarecendo o transporte interno de grãos e alimentos. A
dependência do modal rodoviário agrava o problema.
“Isso impacta o
escoamento da produção agrícola de estados como Mato Grosso, Goiás e
Paraná até os portos de Santos e Paranaguá. Também eleva o custo da
distribuição de alimentos dentro do país, gerando efeitos
inflacionários”, diz o professor.
Ele explica ainda que há
alternativas logísticas para contornar o Canal de Suez ou o Estreito de
Ormuz, como a rota pelo Cabo da Boa Esperança, na África, mas isso
representa acréscimo significativo no tempo e no custo do transporte
marítimo.
Além disso, a volatilidade cambial tende a se
intensificar, o que já foi verificado na manhã desta sexta: o dólar que,
na semana atingiu o menor patamar de fechamento deste ano (R$ 5,53),
voltou a subir, encostando em R$ 5,60.
“Com isso, há uma fuga de
capitais de países emergentes, valorização do dólar. E, embora essa
desvalorização do real beneficie os exportadores agrícolas, ela também
tende a aumentar o custo dos itens importados, somado a questão do
frete”, afirmou.
“Então, assim, seria o que alguns analistas da
área chamam de lógica híbrida, na qual o ganho da exportação dolarizada
tem que ser equilibrado com custos crescentes de importações que também
são dolarizadas e industrializadas”, complementou.
Outro efeito
colateral do conflito é o risco de desabastecimento e inflação nos
mercados importadores de alimentos brasileiros. Países como Egito,
Indonésia, Arábia Saudita e o próprio Irã são grandes compradores de
trigo, milho, frango e açúcar do Brasil. Se as rotas comerciais forem
afetadas, esses países podem enfrentar crises alimentares internas,
elevando ainda mais a tensão geopolítica.