Durante séculos, os líderes da Igreja Católica Romana foram escolhidos
no Vaticano em reuniões privadas conhecidas como conclaves.
O
processo e a votação, que geralmente acontece nos dias após a morte ou
renúncia de um papa, envolve muito segredo. O ritual remonta ao século
XIII, quando as eleições papais podiam durar anos e alguns cardeais já
chegaram a morrer durante o processo exaustivo.
Primeiro, o que é um conclave?
A
palavra conclave vem do latim “cum clavis” que significa fechado com
chave e se refere à prática de confinar os cardeais para permitir que
eles escolham um novo papa sem interferência externa.
A seleção
de um novo papa é um processo de votação antigo e altamente secreto. Há
mistério, ritual e tradição cercando a eleição, que é, especialmente, um
processo político.
“Um conclave é um evento no melhor sentido da
política — é uma consideração pensativa, até mesmo devota, do futuro de
uma comunidade” disse Steven P. Millies, diretor do Centro Bernardin da
União Teológica Católica, uma faculdade de teologia em Chicago à CNN.
“A
‘politicagem’ não nega o envolvimento do Espírito Santo (também não o
garante, é claro). Se o Espírito será atendido, cabe aos cardeais. Mas o
Espírito está presente, e a contagem de votos é uma parte necessária do
processo”, o especialista acrescentou.
Para evitar lobby externo
e garantir que os cardeais sejam livres para escolher quem eles acham
que é o melhor homem para o trabalho, os conclaves acontecem em estrita
confidencialidade, com os participantes “isolados” do mundo.
Eles
são proibidos de falar com qualquer pessoa fora do processo, o que pode
levar vários dias. Também não podem ler relatórios da mídia ou receber
mensagens.
Afinal, quem pode ser papa?
Tecnicamente,
qualquer homem “católico romano” pode ser eleito papa. O especialista
em Vaticano da CNN, John Allen, explica que qualquer pessoa elegível
para ordenação ao sacerdócio católico – portanto, um homem solteiro –
poderia ser eleito papa.
Apesar disso, desde 1379, o papa sempre é
eleito entre os cardeais do Colégio de Cardeais, o grupo que vota no
conclave, restrito também àqueles com menos de 80 anos.
Muitos
dos cardeais são bispos e arcebispos nomeados pelo papa para auxiliar em
questões religiosas. Alguns trabalham no Vaticano, mas a maioria está
espalhada pelo mundo administrando dioceses ou arquidioceses.
Quando
chega a hora do conclave, todo cardeal com menos de 80 anos viaja para
Roma para participar da reunião, pois o voto é presencial.
O
conclave não deve começar antes de 15 dias, nem depois de 20 dias, após a
morte do papa — isso significa que no caso do falecimento de Francisco,
a expectativa é que ele deve ocorrer entre os dias 6 e 11 de maio.
Funcionamento do processo da votação
Depois
que os cardeais chegam ao Vaticano, o conclave começa com uma missa
matinal especial na Basílica de São Pedro. Eles caminham até a Capela
Sistina para começar o processo da eleição.
A votação é realizada
a portas fechadas, e o sigilo é rigorosamente guardado. A capela é
verificada em busca de câmeras e microfones escondidos, e os cardeais
não têm permissão para falar sobre os procedimentos com ninguém de fora
do grupo. Se o fizerem, podem ser excomungados.
O jornalista
Jonathan Mann explicou para a CNN Internacional os rituais que acontecem
dentro da Capela Sistina. A votação acontece em cédulas de papel
distribuídas a cada cardeal, que escreve o nome do candidato escolhido
abaixo das palavras em latim “Eligo in Summun Pontificem” (“Eu elejo
como pontífice supremo”).
Pela regra, os cardeais não podem votar em si próprios e os votos são anônimos.
Quando
terminam, cada cardeal — em ordem de senioridade — caminha até um altar
para colocar cerimoniosamente sua cédula dobrada em um cálice. Os votos
são então contados e o resultado é lido para os cardeais.
Se um cardeal receber dois terços dos votos, ele se torna o novo papa.
Segundo
um documento do Vaticano sobre os procedimentos do conclave, o primeiro
dia é reservado para missas e orações. Caso elas sejam finalizadas pela
tarde, já pode ser realizada uma votação no mesmo dia.
Se nenhum
cardeal receber o número de votos necessário para ser eleito papa,
serão feitas até quatro votações por dia nos dias seguintes — duas pela
manhã e duas à tarde.
O processo pode se repetir até o terceiro
dia de conclave. Se ao final deste dia ainda não houver uma definição, o
quarto dia será reservado para uma pausa para oração e discussão.
Filipe
Domingues, vaticanista e doutor pela Pontifícia Universidade
Gregoriana, explica que as orações são momentos importantes do conclave.
“É uma eleição que coloca em jogo também a vontade de Deus, e o
processo começa sempre com oração, eles têm missa, eles rezam muito
pedindo para que Deus oriente essa escolha”, afirma em entrevista à CNN.
Na
sequência, o processo pode continuar por mais sete rodadas de votação,
da mesma maneira que no início do conclave. Depois disso, há outra pausa
para orações e, na sequência, as votações são retomadas de novo.
Entretanto,
dos últimos 11 conclaves realizados, nenhum durou mais do que quatro
dias, de acordo com a diocese de Providence, Rhode Island, dos Estados
Unidos.
O professor, historiador e teólogo Gerson Leite de Moraes
explica ainda que, apesar das regras, elas são apenas um guia, e no
processo do conclave existem rituais que “não seguem necessariamente a
lógica do relógio”.
“Você pode até ter é a previsão legal de
quatro escrutínios, dois de manhã e dois à tarde, mas pode ser que em um
desses escrutínios você já tenha a solução”, ele afirma em entrevista à
CNN.
O professor acrescenta que “é tudo uma questão regimental
porque os fiéis católicos acompanham tudo de perto, há uma atenção
especial em relação a cada votação que é realizada esperando a fumaça
branca ou preta”.
Fumaça branca indica resultado
Não
se pode entrar na Capela Sistina, porém fiéis e jornalistas ficam
sabendo do resultado por meio da cor da fumaça que sai do telhado do
Vaticano.
As cédulas são queimadas após as votações, uma vez pela manhã e uma vez à tarde.
Caso um papa não tenha sido escolhido, as cédulas são queimadas junto com um produto químico que deixa a fumaça preta.
No entanto, se a fumaça que sair do telhado for branca, isso significa que os católicos do mundo terão um novo chefe da Igreja.
O momento é sempre de muita festa para os milhares de fiéis que esperam o processo no Vaticano.
Tradicionalmente,
cerca de 30 a 60 minutos após a fumaça branca, o novo papa aparecerá na
sacada com vista para a Praça de São Pedro.
O novo pontífice então falará brevemente e fará uma oração. Dias depois da eleição, o papa assume formalmente o cargo.
Os dois últimos papas foram empossados na Catedral de São Pedro.
Com a morte, o funeral e o enterro de papa Francisco, a Igreja Católica
começa os preparativos para definir o sucessor do pontífice - Foto: Gui
Primola/ Metrópoles